domingo, 27 de dezembro de 2009

ABRA A BOCA E FECHE OS OLHOS

Por
Jean Kleber Mattos / Brasília- Fev. 2007

Para mim é uma cena encantadora. O momento em que uma criança de dois anos mais ou menos é apresentada à primeira "balinha" de sua vida. Ainda sem a coordenação e a habilidade suficientes para desembrulhar a guloseima, morde-a com papel e tudo. Logo surgem os adultos dizendo-lhe, entre risos, "não é assim que se come". Isso tudo ante o olhar estupefato do infante.
Delícia!Creio que lembro de minha primeira balinha. Foi em Ipueiras, no Ceará, aos dois anos de idade, anos 40. Chamava-se "Caramelo". Era pequena, amarela, quase cilíndrica. Recheada, um fio de doce marrom avermelhado surgia à primeira mordida. Figurou durante muito tempo nos mostruários. O papel envolvente não era celofane. Era branco, com ilustração de frutas nas cores azul e amarelo.
Eu chamava tudo aquilo de bombom. Aprendi com alguém. Mais tarde soube que o nome certo é "bala". Em Pernambuco, "confeito". O bombom é de chocolate.Também lembro da primeira vez em que bombons com papel colorido encheram meus olhos.
Eurípedes Matos, filho do prefeito Sebastião Matos e recém chegado da América do Norte onde se formara, presenteou meu pai, Neném Matos, com uma caixa. Que felicidade! Bonitos e saborosos! O incrível gosto do chocolate!
Mas o regalo da fome de doces tinha na culinária local um elenco valioso de opções: doce de buriti, doce de leite, pirulitos, rapadura, tijolo de coco e cocada. Meu Deus, as cocadas! Manjar dos deuses. Engolir ou não o bagaço? Eis a questão...Os doces sempre foram prendas bem disputadas nos leilões das festas da paróquia de Ipueiras. As frutas locais eram matéria prima de uma grande quantidade de delícias. Doces de caju, goiaba, jaca, mamão e laranja da terra (da casca). Doce de manga não figurava entre os destaques. Banana, sim. Nas duas formas principais: massa e compota.
O mel de abelhas era sempre, para mim, o de jandaíra (Melipona subnitida Ducke). Meu pai mantinha um pequeno apiário tipo caixote. Cera preta. Favo do tipo panela. Abelha sem ferrão.Impossível esquecer os produtos do engenho de cana. Mel ou melado. Uma delícia. Com farinha então... E com banana fatiada? Hum!
A rapadura e a batida. Esta mais mole e envolta num invólucro de palha de bananeira. A palha de bananeira também embalava a mariola, um doce de banana vendido em tabletes. A palha e a folha da bananeira notabilizaram-se entre nós, nordestinos, como invólucros multiuso. Ainda sobre os produtos do mel de cana, não esqueçamos o alfenim ou "puxa-puxa".
Doces de leite tinha de dois tipos: um deles amarelo claro, de ponto meio cristalizado. O outro, "talhado", era grumoso e mais moreno. Minha preferência recaía sobre o primeiro. Era geralmente servido no bar de seu Guarani.
E o "colchão de noiva"? A iguaria em forma de cocada. Em Ipueiras não tinha. Bastava, porém, pegar o trem e rumar à Sobral. Em poucas horas servíamo-nos. Ainda morno. Sobre o caju, a indústria de doces sofisticou-se com o passar do tempo. Assim, doces da fruta existem na forma de "ameixa" onde o próprio fruto, inteiro, é o doce. Ou como cristalizado, este mais seco, envolto numa camada de açúcar, às vezes com a amêndoa assada do fruto habilmente implantada. Papel celofane o recobre.
No ambiente caseiro, era o doce em massa e a compota, ou a castanha assada cristalizada feita ao fogo, no tacho, com mel de açúcar cristal, até dar ponto.
Os doces sempre foram um ingrediente notável nas cenas de ternura. Desde a "hollywoodiana" caixa de bombons com a qual se adula a amada, até àquela conhecida brincadeira de por um doce na boca de alguém com a frase: "abra a boca e feche os olhos". Às vezes é farelo de rapadura... Tem coisa melhor?Os médicos nos advertem sobre a perigosa combinação do consumo de doces e a vida sedentária. Risco de diabetes.

Para mim, apenas um risco consigo reconhecer quanto ao consumo dessas delícias.Comer demais. Oh! Bicho bom !

Foto: site forademoda.files.wordpress.com/2007/08/convite_frente.jpg

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